terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Cativeiro: A verdadeira crueldade

Muito se fala de todo tipo de crueldade: violências, tortura e até abandono. Mas, ao meu ver, muito pior que tudo isto é o cativeiro. Uma pessoa que sofre violência ou tortura tende a reagir. Uma pessoa abandonada está livre apesar do desamparo. Mas uma pessoa em cativeiro está presa e não sabe como reagir para se libertar. Principalmente se o cativeiro for psicológico ou emocional. Pior do que o cativeiro físico, esta categoria inclui, como exemplo de modalidade, a chantagem. A pessoa é influenciada de várias formas a se manter aprisionada, não só fisicamente, mas também nas decisões a tomar. Vemos várias pessoas de nosso círculo social tentando tomar decisões por nós ou influenciar nossas decisões. Isto é uma tentativa de controle e de cativeiro psicológico (ficamos presos a essas decisões). Quando cedemos a essas forças externas, acabamos por nos sentir, mais cedo ou mais tarde, contrafeitos. (Às vezes, muito mais tarde, quando já não há correções possíveis. Que digam os mais velhos.)

Outro exemplo, que tem sido mais frequente, ocorre na relação pai/filho, principalmente na relação mãe/filho. Os pais tentam, às vezes, direcionar a vida dos filhos, tomando por eles decisões que só a eles cabem. Isto pode acontecer por diversas razões: sofomania dos pais, que acreditam saber o que é melhor para os filhos; frustração, que os faz estender os próprios sonhos aos filhos; e, mais recentemente, a síndrome do ninho vazio. Com as conquistas feministas, as mulheres passaram a trabalhar mais (muitas vezes em tempo integral) e fora de casa. Com isto, passaram a se dedicar menos aos filhos, não com relação às necessidades destes, mas presencialmente. Quando os filhos chegam à adolescência e iniciam o processo natural de desvínculo (vulgarmente chamado “desmame”), a mãe percebe que passou pouco tempo com eles e tenta desesperadamente corrigir isto, obstruindo o processo de desvínculo.

Outra situação comum de cativeiro é a de animais. Removendo o eufemismo presente na máxima “o cão é o melhor amigo do homem”, o fato é que o cão é o melhor escravo do homem. O homem domesticou o cão para que ele prestasse certos serviços, como segurança e caça, apenas por comida. (Duvido que você queira fazer só por comida tudo o que um cão faz!) Afinal, isto não está de acordo com a definição de escravo? E o dono do animal é assim chamado não em vão; ele não é amigo. A razão pela qual esta relação não é considerada uma escravidão é o vínculo afetivo que se acaba criando entre o dono e o animal mas que, como já dito, não passa de uma técnica aperfeiçoada de controle. E assim é com outras tantas espécies domésticas. Para piorar, surgiu o comércio de animais, que acabaram virando produto. Isto reforça uma imagem de escravidão animal e um aspecto de falsidade nas relações homem/animal. Este vínculo falso acarreta outros tipos de crueldade contra os animais, como o corte do rabo nos cães (para “apurar a raça”), a castração e a procriação forçada (em busca de novas raças), principalmente entre parentes (para fixar mais rapidamente as características desejadas da nova raça). E com o aumento dos casos de estresse por sobrecarga no trabalho (às vezes mal diagnosticados), os animais domésticos ganharam uma nova função: a de consoladores e apoio emocional. Um papel que reforça o aspecto emocional do cativeiro. Aqui, um cativeiro mútuo, já que o dono também se prende ao animal enquanto este seja um paliativo para um problema que, por um materialismo nocivo, não se busca resolver.

Vossos filhos não são vossos filhos
Gibran Khalil Gibran, O Profeta
Mais vale um pássaro na mão do que dois voando
Dito popular

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