segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Bombas de gás hilariante

Estou com uma ideia para os protestos. Já que a polícia joga bombas de gás lacrimogêneo e, diferentemente da polícia, se um cidadão comum faz o mesmo é considerado violento, então joguemos bombas de gás hilariante, hehehehe. Os policiais ririam tanto que não conseguiriam agir contra a população. O risco seria eles apertarem os gatilhos sem querer de tanto rir, e matarem inocentes, hehehe.

Brincadeiras à parte, o gás hilariante é anestésico e pode dificultar a ação da polícia. Outra coisa, um indivíduo dificilmente seria chamado de violento por lançar gás hilariante na polícia (apesar da dor provocada). Parece-me uma forma ótima de se defender. O difícil é obter o gás. Talvez precisássemos da ajuda de um odontologista.

Outra coisa que ajuda são as bombas de fumaça, que atrapalham a visão dos policiais e, por isso, dificultam sua ação. É útil contra os policiais mascarados, contra os quais o gás do riso provavelmente não tem efeito. Talvez dê para juntar a fumaça e o gás do riso na mesma bomba.

Este foi um artigo simples com uma ideia simples. Boa sorte para quem tentar pô-la em prática.

sábado, 28 de setembro de 2013

Crítica objetiva às psicociências

Outros dois artigos já havia escrito aqui sobre loucura e que criticavam indiretamente as psicociências, a saber, Normose e loucura social e Loucura artística × Loucura social. Desta vez resolvi escrever este artigo fazendo uma crítica mais objetiva, demonstrando os erros das psicociências em vez de apenas dizer que psiquiatras e psicanalistas adoram diagnosticar os outros com alguma doença que eles mesmos inventaram.

O principal erro está na forma como as “doenças” são definidas. Enquanto nas outras áreas da medicina as doenças têm uma causa bem definida, a psiquiatria insiste em definir doenças e transtornos a partir de sintomas. Falta assim metodologia científica nas psicociências, o que tira delas qualquer status de ciência. Considere, a título de exemplo, a histeria. O termo foi primeiro utilizado pelos antigos gregos para se referir ao que hoje chamamos de TPM, que, para eles, era um movimento anormal de sangue ou essência do útero para o cérebro ou outras partes do corpo, o que explicaria as variações de humor. Muito mais tarde, um psico-alguma-coisa francês resolveu utilizar o termo para descrever certos sintomas que observou em muitas mulheres. Pouco depois, observaram os mesmos sintomas em alguns homens. Por fim, descobriram que o surgimento em grande número de mulheres histéricas era devido à repressão sexual que sofriam de uma sociedade machista. Daí surgiram tratamentos (alguns esdrúxulos, como o uso de vibradores, mas que funcionavam bem) para a histeria. Mas qual o tratamento para homens histéricos? Vibradores também? Não era em todos que os sintomas apareciam por repressão sexual. Se hoje a histeria ainda existe, raramente é esta a causa.

É claro, todos os especialistas entendem muito bem esta situação da histeria. Mas a questão se figura doutra forma quando lembramos outros problemas. A esquizofrenia até hoje é tratada por eletroconvulsão, mesmo sem ter uma causa bem definida (aparentemente baseando-se na ideia de que o choque elétrico faz a pessoa “acordar para o mundo.” Veja o primeiro parágrafo desta página dizer que o mecanismo de ação não é conhecido, mas acredita-se (…)). Aliás, a esquizofrenia é a definição mais criticada da psiquiatria.

Até hoje recomenda-se o tratamento com lítio para portadores de transtorno bipolar apesar dos vestígios de que as causas do transtorno variem conforme o portador: sabe-se que, em muitos casos, ele está relacionado com genialidade, mas algumas pessoas sem vestígio de genialidade também o apresentam. Mesmo assim, para todas elas, é recomendado o tratamento com lítio que, pelo que se sabe, apenas disfarça os sintomas. A variação de humor nessas pessoas é que é considerada doença, em vez de sintoma de doenças que os estudiosos acabam não estudando. A propósito, a razão do aumento dos casos de transtorno bipolar, depressão e outros males da mente pode estar relacionada, segundo estudos, ao estresse, cuja verdadeira solução seria trabalhar menos.

Às vezes, pesquisadores tiram tomografia do cérebro “doente” para confirmar que se trata de uma doença biológica. Mas isto é uma grande burrice. Se uma pessoa está triste, por exemplo, é claro que a parte do cérebro relacionada com a tristeza está mais ativa. A tomografia serve apenas para confirmar os sintomas que os estudiosos observam, ou seja, mostrar que não se trata de uma falsa impressão. Assim, a tomografia não desvenda a causa dos sintomas, apenas apresenta uma confirmação biológica dos mesmos. Uma atividade maior ou menor de uma parte do cérebro é, na verdade, mais um sintoma, desta vez interno, quero dizer, que ocorre dentro do organismo e não pode ser visto por quem está de fora. Mas não é causa e, não sendo causa, não pode ser doença.

A metodologia que as psicociências deveriam seguir, como qualquer ciência, é começar estudando sintomas separadamente, analisando as possíveis causas para cada um. É preciso entender o que o outro vê e sente e como ele pensa, para então diagnosticá-lo. É preciso entender a doença para que ela possa ser considerada doença. E é só conhecendo as causas de uma doença que um tratamento adequado pode ser dado.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Loucura artística × Loucura social

Pode ser muito afirmar o que um autor quer ou não dizer com sua obra. Mas talvez as pessoas não entendam o que é o maluco beleza de Raul e Paulo. Isto porque elas entendem este maluco beleza como o louco puramente artístico. Acontece que o artista com sua loucura nunca sofreu preconceito. Até mesmo o gay, quando é mais artista do que gay (a famosa bicha), sofre menos preconceito (mas isto seria assunto para outro artigo). A loucura do artista é com relação à forma, é estética. São roupas, maquiagem e adereços. São trejeitos. É linguagem. Nada que promova ideias, que mude a vida em sociedade. Por isto mesmo, o louco artístico sempre foi muito bem aceito pela sociedade.

Já o louco social tem outra visão sobre a sociedade e insiste em mostrar a outras pessoas que o modelo atual de sociedade é falho em muitos aspectos. Ele é antes um gênio. E esta genialidade insiste em lhe bater à porta da consciência para mostrar os erros na sociedade de que somos parte. O louco social, sim, sofre preconceito, é quase sempre incompreendido. Quando insiste em mostrar suas ideias aos demais, é considerado insuportável e rotulado com o nome de várias doenças.

Esquizofrenia, porque aqueles que não entendem suas ideias acham que elas fogem à realidade ou, em casos extremos, porque ele se fecha quase completamente para fugir da realidade sofrida à qual é obrigado. Transtorno bipolar, porque, quando já não aguenta mais se reprimir para ser aceito pela sociedade, estorna num só golpe suas angústias e ideias (e porque sua genialidade é abusada por uma sociedade que não sabe aproveitá-la). Inabilidade social ou comportamento antissocial, porque sua personalidade não se adequa ao perfil exigido pela sociedade. Depressão e síndrome do pânico, por se fechar às vezes para a reflexão, buscando entender o mundo que o rodeia e, principalmente, a si mesmo. Autismo e suas variantes, como a síndrome de Asperger, quando sua genialidade é acompanhada de introspecção e de outros traços incomuns de sua personalidade. Hebefrenia e juventude heboide, quando sua raiva da sociedade na juventude se mistura à falta de esperança.

Raul Seixas e Paulo Coelho foram verdadeiros loucos sociais. Paulo chegou a ser internado pelo que hoje é considerado erro de diagnóstico. A sorte de Raul no auge de sua carreira foi sua loucura social ser confundida como meramente artística, pois ele era artista. Mas ele tinha suas ideias a respeito de sociedade e loucura, como deixa claro em suas músicas. Pena que a arte, pela interpretação subjetiva, não mova mudanças.

Em feira de Santana ou mesmo em Paris
Não bulo com governo, com polícia, nem censura
É tudo gente fina, meu advogado jura
Raul Seixas, Quando Acabar, o Maluco Sou Eu
Quando o homem aprende a ver, ele se descobre sozinho no mundo, apenas com a loucura(…) Seus atos, bem como os atos de seus semelhantes em geral, parecem-lhe importantes porque você aprendeu a pensar que são importantes.
Carlos Castañeda, Uma Estranha Realidade, grifo do autor

domingo, 15 de setembro de 2013

Jesuíta ou franciscano?

O novo papa é da ordem jesuíta. Como nome, escolheu Francisco em homenagem a são Francisco de Assis. Desde que o papa foi eleito, muito já se falou da ordem franciscana cada vez que o papa foi mencionado. Ele é tido como um papa jesuíta de influência franciscana. Mas, afinal, o papa era jesuíta, não franciscano! As duas ordens não têm nada a ver. E é muito fácil alegar influência franciscana; qual frade, afinal, não faz isso?

São Francisco, muitos já devem saber, foi filho de um burguês da cidade de Assis, Itália, e sequer se chamava Francisco. Um dia teve uma visão e passou a viver como um mendigo. Supostamente fundou a primeira ordem franciscana (depois tiveram o saco para inventar outras). Enquanto as ordens, digamos, não-franciscanas, em geral, não possuem ramificação, a ordem franciscana possui sete ramificações e mais umas tantas comunidades (congregações). A vida de são Francisco é povoada de mitos, mas os vestígios históricos mostram que ele viveu literalmente como um mendigo e que assumiu ser um preguiçoso e desocupado (os mendigos que você ignora na rua podem ser novos sãos franciscos).

Mas, enquanto as ordens franciscanas são até bonitinhas (eu mesmo tenho certa afeição por são Francisco), a ordem jesuíta tem um passado negro. Negríssimo. A despeito de ideais cosmetizados como evangelização, a verdadeira intenção na criação da ordem era a expansão do poder da Igreja na era das navegações. Novas terras eram (re)descobertas e a Igreja queria lançar seus tentáculos sobre elas. O início da ordem foi violento, com um histórico de guerras. E isto era visto como martírio. Logo a ordem abandonou seu caráter violento e passou até a adotar, de certa forma, a cultura dos povos que conhecia. Mas este aparente espírito de inculturação tampouco significou uma evolução em direção à benevolência. Foi antes um aperfeiçoamento de seus métodos baseado no sincretismo.

A verdadeira finalidade da ordem, que era estabelecer o poder clerical nas novas terras, acabou por suscitar a desavença de muitos intelectuais e nobres "anticristãos" que surgiam na época, e que culminou na supressão da companhia. Mais tarde a companhia foi restaurada, já sem seu objetivo original. Os jesuítas foram mártires de verdade mais tarde, no holocausto. Mas isto não pode mascarar suas origens.

Ao menos o novo papa tem correspondido minimamente ao ideal de voto de pobreza dos franciscanos ao rejeitar a pompa vaticana. Mas a realização da Jornada Mundial da Juventude só mostrou que tudo não tem passado de demagogia.

Ad maiorem Dei gloriam
Para a maior glória de Deus, lema jesuíta
Irmão Sol, Irmã Lua
Retirado do Cântico ao Irmão Sol, ou Cântico das Criaturas, é filme de Franco Zeffirelli
Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz
Primeiro verso da oração de são Francisco

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Adão, Eva e a psicologia reversa de Deus

Muitos entendem a história de Adão e Eva como um caso de desobediência a Deus. Mas não é nada disso. Afinal, quando você realmente quer que uma criança pequena não mexa numa coisa, o que você faz? Mostra essa coisa a ela e diz "não mexa nisso senão você vai apanhar"? Claro que não! A não ser que você seja um pai muito burro. Para que a criança não mexa, você a deixa distante do objeto "proibido". Agora, se você quer que a criança mexa, você chama a atenção dela para o objeto em questão e diz para ela não mexer. É a famosa psicologia reversa, baseada na ideia de que o homem é incentivado pela proibição, e que se expressa no dito "tudo que é proibido é mais gostoso".

A questão é que, se até o homem, imperfeito como é, é capaz de entender a psicologia reversa, como um Deus perfeito pode ter deixado isso passar despercebido? Foi Ele que nos criou para reagirmos assim às proibições. E, querendo Ele que viéssemos à Terra, soube perfeitamente como agir para conseguir o que queria. Ele poderia ter deixado Adão e Eva bem longe da árvore cujo fruto era proibido; quiçá ter colocado uma cerca bem grande para proteger a árvore. Mas, ao invés disso, fez questão de mostrar a ambos a árvore e enfatizar que eles não deveriam comer do fruto dela.

E, com isto, Ele talvez tenha conseguido até mesmo enganar a serpente, que teria acreditado descumprir a vontade de Deus ao fazer Adão e Eva comerem do fruto (mas acho que nem a serpente seria tão burra, o que me faz pensar no que a levou a isso). A verdade é que nada nunca foge à vontade de Deus. Apenas acreditamos que isso aconteça por não compreendermos a perfeição divina. Diz-se que Deus escreve certo por linhas tortas. Mas não existem linhas tortas para Ele. Deus escreve certo por linhas retas. Nós é que somos astigmatas.

domingo, 8 de setembro de 2013

Normose e loucura social

O conceito de loucura é relativo. Depende da sociedade. Basta nos lembrarmos que homossexualidade e histeria já foram considerados doenças mentais pelos psiquiatras. Hoje já não são, mas muitas pessoas ainda insistem em cultivar um raciocínio medieval. E, não obstante estes exemplos históricos, pessoas no mundo todo ainda se esforçam em se equilibrar em convenções sociais. Pior ainda, estas pessoas têm a triste tendência a julgar aqueles que se negam a respeitar as convenções sociais. Pois, de fato, estas convenções são absurdas.

Mas as "ciências da psiquê" têm evoluído no seu conceito de doença. A ponto de evitarem este termo em algumas situações. E uma nova "doença" surgiu: a normose. Esta já era conhecida antes pela filosofia mas só foi reconhecida pela psicanálise recentemente. Trata-se da tentativa desesperada de um indivíduo de seguir todas as normas e convenções sociais. Sim, porque se preocupar com tantas regras desnecessárias é desesperador e pode levar à loucura. E muitos hábitos considerados normais são, na verdade, nocivos a nossa saúde. Agora todos aqueles que são julgados malucos por conta de seus hábitos e personalidade incomuns, mas nada prejudiciais, podem dar o troco e xingar todos os que se acham "normais" de normóticos.

Mas, mesmo com todos os avanços nas psicociências, estas ainda não se libertaram por completo dos tabus discriminatórios envolvidos no conceito de loucura. E fica realmente muito difícil devido a outra ciência: a sociologia. Em geral, ainda são considerados formas de loucura pela psicociência aqueles perfis que são atualmente inconvenientes do ponto de vista sociológico. É a chamada loucura social, aquela que supostamente prejudicaria a vida em sociedade, nos moldes da sociedade moderna. Um exemplo é o perfil de trabalhador. Mesmo hoje, a sociedade restringe desnecessariamente o perfil desejado de um trabalhador. Não faz sentido, mas todos aceitam um perfil básico. Aquele que não corresponde a essas características básicas é considerado doente. Por exemplo, antissociabilidade (e, por vezes, introspecção, principalmente quando é confundida com antissociabilidade) é considerado loucura.

Para que um indivíduo receba um diploma, ele deve frequentar uma instituição de ensino, assistindo às aulas em turma. Quem não quer frequentar uma instituição de ensino é considerado louco ou, ao menos, vagabundo. Isto é uma forma indireta de forçar a socialização. O leitor aqui faça o favor de distinguir o frequentar uma instituição de ensino do estudar. Um aluno assíduo não é necessariamente estudioso, e vice-versa. O estatuto da criança e do adolescente garante ao adolescente (até certa idade) o direito à educação, mas este direito é uma forma indireta de obrigar o jovem a frequentar uma escola, forçando-o à socialização e a uma educação voltada para o trabalho.

Às vezes isto se associa com alguma outra área como a economia. Isto acontece, por exemplo, na criação de perfis de consumo. A sociedade mantém vários perfis de consumo, que são reciclados de tempos em tempos (moda). Quem não opta por nenhum destes perfis de consumo pré-estabelecidos, mas segue o próprio, recebe rótulos pejorativos como os de louco, mão-de-vaca e excêntrico. Isto é uma forma de exigir certo padrão de consumo, fazendo as pessoas gastarem, a moeda circular e a economia crescer. Este consumo, aliás, é também estimulado por uma falsa ideia de poder chamado poder de consumo.

Recomendo o artigo Loucura e genialidade: uma perspectiva social e filosófica. Talvez seu navegador dê um aviso de cuidado com a página. Isto se deve ao fato de ela usar protocolo https (conexão segura) sem usar um certificado reconhecido pelo seu navegador. Isto não indica qualquer risco, desde que você não informe nenhum dado pessoal à pagina. Conexões https são usadas geralmente para algum tipo de "conta" na internet (como serviço de e-mails, serviços bancários, sua conta do google ou sua conta do facebook).

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Constituição Federal de 1988, artigo 205 (grifo nosso)

sábado, 24 de agosto de 2013

Criança Esperança

Mais uma vez o Criança Esperança. As pessoas são motivadas a doarem dinheiro pelo bem de crianças e adolescentes marginalizados. Mas eu só tenho críticas com relação à campanha. A primeira delas é mais conceitual, mas traz discernimento, ajuda a entender mais claramente quando estamos de fato fazendo um bem a outrem. Trata-se do conceito de caridade. Definitivamente (e as religiões do mundo todo hão de convir com meu conceito), caridade não se faz com dinheiro. A caridade é sublime demais para se inclinar diante da lei do dinheiro. Se há dinheiro, ainda pode ser chamada de ajuda, mas não de caridade. Dar brinquedos a crianças, por exemplo, não é caridade. Dar afeto (sem cativeiro emocional), sim. Educar para o trabalho não é caridade. Educar para a vida, sim. Tampouco movimentos com objetivos sociais são caridade, mas antes aqueles voltados ao próximo. Aquele velho movimento em que cada pessoa que é ajudada deve ajudar a outras três (corrente do bem, se não me engano) tem caráter didático, logo não é caridade. Mas ajudar o próximo sem contá-lo e sem fazê-lo por um sentimento de débito, isto sim é caridade. Claro que muitas pessoas integradas ao projeto Criança Esperança são movidas por um sentimento genuíno, mas isto não torna o projeto genuinamente caridoso.

O verdadeiro objetivo do Criança Esperança é a integração de crianças e adolescentes marginalizados à sociedade. A preocupação então é socio-econômica, não diretamente com o próximo. Tanto é que a campanha só é voltada às crianças e aos adolescentes, que estão ainda em fase de formação psicológica e, portanto, são mais facilmente direcionáveis. Assim as intenções não são das mais humanas. E, visto este objetivo, a campanha não funciona. É claro que, se tomados os objetivos indiretos dela, ela funciona, sim. E as evidências são mostradas a cada ano. Por outro lado, mais jovens são marginalizados conforme os anos passam. Arrecadar dinheiro para sustentar e preparar esses jovens apenas reforça um sistema que é o responsável por esse quadro.

O erro do sistema está em valorar as necessidades de subsistência de um indivíduo. É isto o que dificulta a integração de alguns indivíduos à sociedade. Estas necessidades deveriam ser oferecidas gratuitamente à população, sem custos em nenhum estágio. Por exemplo, distribuição de cestas básicas (realmente básicas, que não satisfazem ninguém, mas tampouco deixam a pessoa morrer de fome literalmente), que não devem ser compradas pelo governo mas obtidas de plantações específicas para este fim, talvez mantida pelos mesmos que desejam usufruir deste benefício. Ou podem ser pagas com impostos arrecadados de agropecuárias, impostos estes que devem incidir diretamente no preço do produto (a ideia é que isto equivaleria a cobrar o alimento como imposto). Moradias de área mínima, sem conforto, sem privacidade total e sem impostos. Cota gratuita no consumo de água, calculada por número de moradores. Estas e outras medidas poderiam ser compensadas por aumentos ínfimos nos serviços pagos. A taxa do consumo de água, por exemplo, poderia aumentar infimamente para aqueles que consomem o excedente. As taxas relacionadas à moradia, na prática, já estariam compensadas pela especulação imobiliária, mas o ideal é que os valores de venda e aluguel caiam e os impostos sobre a moradia subam um pouco (não falo aqui como um especialista em tributação).

Alguns podem pensar que isto faria com que algumas pessoas "relaxassem" e passassem a trabalhar menos. Mas isto é um engano. Quantas pessoas trabalham apenas o mínimo para subsistência? Você agiria assim? As pessoas não querem apenas sobreviver, elas querem viver bem, mesmo que este conceito seja bastante subjetivo. Muitas vezes um marginalizado só se mantém marginalizado por falta de opção. É só se lembrar de casos famosos como o músico Seu Jorge e o "mendigo gato," hoje modelo. Uma medida como a apresentada aqui poderia incentivar essas pessoas à reintegração, que passariam a trabalhar para viver melhor. E, de quebra, poderia aumentar um pouco o PIB.


Recomendo também a leitura do artigo externo A hipocrisia do Criança Esperança, que questiona a campanha da Globo com base no fato de que o valor dos impostos sonegados pela empresa é maior que o arrecadado com a campanha. De um modo geral, o artigo critica, por meio de fatos, a sonegação de impostos por parte de grandes empresas. Por todas as razões apresentadas aqui é que eu não contribuo com o Criança Esperança, nem neste nem nos próximos anos.

Não estou defendendo nenhum sistema tributário. Apenas apresentei uma possível solução com base na preferência da maioria da população em manter um sistema tributário. A outra solução, naturalmente, seria acabar com todos os impostos e cada um cuidar de si (sem ignorar por completo o aspecto social de nossas vidas). Mas nem todos, inclusive eu mesmo, estão preparados para isto, até porque não convém ao governo nos preparar. Quando eu, ou melhor, todos nós nos sentirmos preparados para arcar com todos os nossos gastos (e tivermos serviços particulares de qualidade), é claro que vou preferir a não tributação, pois evitaria um gasto indevido do dinheiro público.

sábado, 3 de agosto de 2013

Aos policiais

Costumo ver os policiais como abelhas de uma colmeia ou formigas de um mesmo formigueiro, que sempre obedecem cegamente à rainha. A respeito, aliás, lembro-me de uma fábula sobre uma abelha que foi procurar emprego. Ao chegar na colmeia, ela pergunta sobre suas obrigações no trabalho.

―Você deve proteger a colmeia. Se algum bicho chegar perto, você deve ferroá-lo. Isto não o impede de atacar a colmeia, ainda mais se for um bicho grande. Mas as chances disso acontecer diminuem conforme mais abelhas o atacam.

―E o que eu ganho com isso?

―Logo depois da ferroada, você certamente vai morrer mas pelo menos terá defendido a colmeia. Depois disto, contratamos outra abelha para tomar seu posto.

―Tem algum seguro contra acidentes?

―Não pelas ferroadas, nem se você for atingida por um inimigo. Estes acidentes não são cobertos pelo seguro.

―E quais são os benefícios?

―Na verdade, não há benefícios… E então, vai querer o emprego?

―Sim.

Talvez esta fábula sirva bem para ilustrar o dilema dos policiais. Sabemos que existem bons e maus elementos na polícia. Mas os bons se enganam ao acreditarem piamente na hierarquia, mais do que nas próprias convicções. Melhor dizendo, quando a hierarquia, na corporação ou fora dela, se torna a maior convicção. Quando falo em hierarquia fora da corporação, refiro-me à subordinação ao governo. O policial deve ter em mente o próprio conceito de certo e errado, e se basear nele durante o trabalho.

Outra história que me remete é a de V de Vingança (os quadrinhos e o filme). A série se passa numa Inglaterra totalitarista. Dois dos personagens da trama são Eric Finch, chefe da Nova Scotland Yard e ministro de investigações, e seu parceiro Dominic Stone. Na história, eles são pessoas decentes e sem ambição que servem ao governo devido a um sentimento patriótico e por acreditarem na ideia de ordem que é propaganda do governo (Cabral e Paes à cabeça?). Até o momento em que descobrem as atrocidades cometidas por este governo e se lamentam por terem sido cúmplices durante tanto tempo.

Já soube uma vez de uma policial que foi promovida a delegada. Ela tentou corrigir certos problemas na delegacia, pequenas infrações por parte dos funcionários, até onde sei. Depois de pouco tempo, ela começou a receber ameaças anônimas e decidiu abrir mão do cargo. Na verdade, foi um medo irracional. O perigo é inerente à profissão e não há porquê um policial agir com base no medo. Se é pra ter medo, melhor abandonar a profissão. Quando um indivíduo escolhe ser policial, está ciente dos riscos envolvidos. É claro que não deve se arriscar desnecessariamente quando há uma segunda solução isenta de riscos. Mas tampouco deve temer agir como entende ser melhor.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Nacionalismo é sempre um mal

Muito já se falou sobre os diferentes tipos de nacionalismo e a nocividade de cada um. O mais criticado é o nacionalismo exacerbado, que promove guerras e incentiva a violência física e a xenofobia. Mas a verdade é que todos eles são nocivos. Basta observarmos o conceito de nação. Não pretendo aqui dar uma definição precisa, mas posso indicar quatro elementos principais que caracterizam uma nação: território, povo, cultura (quero dizer, comportamento, costumes) e Estado. Destes apenas dois são inofensivos, a saber, o povo e sua cultura.

A ideia de território é uma que dá margem a guerras e xenofobia. Mas a terra não fala, não argumenta, não motiva ninguém ao erro. O elemento mais perigoso de uma nação afinal é o Estado. Todos sabemos que este tem suas imperfeições. Mas o nacionalista, apesar de criticar o Estado e dele exigir mudanças, tende a defendê-lo de alguma forma. Ou seja, há um sentimento ambivalente por parte do nacionalista. Quando um nacionalista critica atos de depredação contra um prédio da alerj ou da prefeitura, está defendendo o Estado, já que estes prédios são verdadeiros símbolos do mesmo. Quando um nacionalista carrega a bandeira, está demonstrando que sua paixão não é só pela cultura popular, já que a bandeira é um símbolo criado por aqueles que instauraram a república por aqui. Um símbolo inspirado, aliás, na bandeira do Brasil império.

É claro que nada impede que um símbolo seja admirado em sua condição estética. Afinal, quantos estrangeiros não acham a bandeira do Brasil bonita? Eu mesmo o acho. Mas não adianta se enganar alegando que sua admiração é puramente estética ao mesmo tempo que defende o Estado que é simbolizado. (Aliás, eu acho bonita a bandeira do Brasil como também acho bonita a bandeira do Nepal.)

É preciso, portanto, que as pessoas reflitam mais sobre suas paixões e entendam que estas devem ser direcionadas à cultura popular, nunca ao Estado. Sem esta mudança interna, jamais proveremos qualquer mudança relevante ao sistema político vigente, pois sempre ponderaremos o “mal” que faríamos ao Estado que nos governa, a ponto de ignorarmos o mal que nos governa.

sábado, 20 de julho de 2013

Casamento: um resquício do Estado religioso

A ideia de escrever este artigo veio das tentativas de muitos de tornar legítimo o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Os que são contra costumam se firmar na definição de casamento dada pela constituição. Mas é importante lembrar que esta definição não quer dizer nada quando tratamos justamente de mudanças na lei. A lei deste país diz que casamento é entre um homem e uma mulher porque quem a escreveu assim resolveu. Mas tome-se como exemplo as leis de nações do oriente médio. Estas, em contraponto, definem o casamente de forma a poder ser poligâmico, diferente daqui. E existem ainda pelo mundo aldeias que permitem a poliandria (quando uma mulher se casa com vários homens).

Estas diferenças ocorrem por causa da religião em que estas leis se embasam. As nações poligâmicas do oriente médio utilizam o corão para justificar seu conceito de casamento. E nossa lei define o casamento como sendo entre um homem e uma mulher porque é baseada no catolicismo. De fato o casamento é um conceito religioso e o Estado não deve legislar sobre ele. Isto vai contra a ideia de um Estado laico. Deve ser deixado a cargo de cada religião o conceito de casamento. Que cada uma tenha o seu e o indivíduo se case na religião que quiser (ou que puder).

A solução que se adotou aqui para o problema do casamento entre pessoas do mesmo sexo foi a criação de um novo conceito, o de união homo-afetiva. É uma solução risível dado seu valor puramente simbólico. A união dá quase os mesmos direitos, se não os mesmos, que o casamento civil, apenas tem outro nome. Devemos definitivamente acabar com o conceito de casamento. Podemos, num primeiro momento, admitir o conceito de união apenas para não sermos radicais e facilitar as mudanças. Mas o conceito de união também é muito restritivo. E os muçulmanos que querem se casar com várias mulheres? Eles não podem ter esse direito? Além de outras formas de relacionamento ainda mais complexas. Só o que deve permanecer são contratos como os de comunhão de bens. Pois é sobre isto que deve haver lei. E o conceito de estado civil também deve desaparecer como consequência.

sábado, 29 de junho de 2013

A quarta onda das religiões e o fim das religiões

As ideias apresentadas aqui se baseiam numa explicação de um amigo que assistiu a uma palestra sobre as teorias do filósofo alemão Martin Heidegger. O foco da palestra era o ser e o dasein, mas um dos temas abordados foi o das três ondas nas religiões. A primeira onda é aquela em que a religião é una com o Estado. Ela justifica leis e punições com seu conceito de bem e de mal e elege governantes como deuses ou escolhidos de deuses. Ela promove guerras como missão divina ao julgar o deus da nação inimiga como diabo. A primeira onda acontecia na antiguidade e na idade média.

Na segunda onda, começa a haver uma separação entre religião e Estado. Foi a época do iluminismo e da revolução francesa. A regra então era o ceticismo e o ateísmo, mormente para se opor à Igreja. Igreja à qual os governantes já não davam ouvidos quando tinham intenções políticas mais fortes. Surge o conceito de laicismo. Na terceira onda, a religião se torna pessoal. Cada um tem a sua, sem necessariamente seguir a "oficial". De fato, neste ponto, o Estado já não tem mais uma religião oficial.

Mas estas ondas não têm uma época certa. A mudança da primeira para a segunda fase é nacional. Quero dizer, ela depende de cada nação, de cada Estado. Por exemplo, em muitos países do oriente médio esta mudança ainda não aconteceu. As leis desses países é fortemente baseada no corão e nos preceitos islâmicos. O análogo ocorre em Israel com o judaísmo. Já a mudança da segunda para a terceira fase é pessoal. Muitos países do ocidente, como o Brasil, encontram-se na segunda fase, sendo que algumas pessoas nesses países se encontram na terceira, i.e., optam pela religião que querem, não pelo cristianismo ou pela religião dos pais (assim posto, religião pátria, por ser a religião do país ou dos pais).

Eis a teoria como me foi apresentada, mas eu acrescentaria a ela uma quarta onda: a onda da religião verdadeiramente pessoal ou o fim da religião. Na terceira onda, as religiões se tornam pessoais mas ainda recebem nome (cristianismo, espiritismo, islamismo, budismo…). Isto acontece porque a mente das pessoas ainda está aprisionada a escolher uma religião dentre as "disponíveis". Ouve-se as pessoas dizerem que escolheram a religião que as fazia se sentirem melhor, ou a que era mais adequada a elas. Elas ainda entendem a religião como um sorvete numa sorveteria: há um número limitado de opções e é preciso escolher uma, apenas uma. Ou ao menos uma de cada vez.

Na quarta onda, as pessoas se libertam deste tipo de rotulação e passam a entender a religião como um simples sistema de credos, sem dogmas e sem igreja. A igreja passa a existir apenas como "templo", ambiente físico para fins cerimoniais, não mais como instituição. As pessoas ainda realizariam e participariam de cerimônias conforme a própria vontade. E a variedade de crenças seria tão grande que se tornaria inviável nomeá-las. A forma mais adequada de se nomear um sistema de crenças de uma pessoa seria através do nome da pessoa: religião ou crença de fulano, de sicrano, beltrano… A religião seria verdadeiramente pessoal. Ou, para os que entendem que dogmas e igreja são inerentes às religiões, isto significaria o fim das religiões.

Não há religião superior à Verdade.
Helena Petrovna Blavatsky

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Derrubada a PEC 37

Nesta terça-feira (25), a câmara dos deputados derrubou a PEC (proposta de emenda constitucional) 37 por 430 votos contra 9 favoráveis e 2 abstenções. Queria ter escrito sobre ela aqui quando ainda estava em debate, mas não tive tempo. Se tivesse sido aprovada, a PEC 37 retiraria o poder de investigação criminal de órgãos como o MP (Ministério Público), deixando-o apenas a cargo das polícias civis e federal. O MP ainda teria o direito de denunciar e de acompanhar as investigações (o que de fato lhe compete) e poderia fazer investigações informais com objetivo administrativo (que, legalmente, não servem de nada).

Os que defendiam a PEC 37, incluindo seu autor, delegado de polícia, diziam que se tratava de uma redundância do que diz a constituição: a investigação é dever da polícia, não do MP. Mas muitos eram contra, pois ela acarretaria sobrecarga das polícias e concentração de poder. Diziam que a polícia poderia fraudar investigações, deixando políticos corruptos impunes. Mas, pelo que pude entender, este não era o problema primário. Caso a polícia fraudasse as investigações, ou cometesse qualquer crime, ainda poderia ser denunciada pelo MP. Mas quem investigaria a polícia? A própria polícia! Isto seria uma falha na legislação. Mesmo que a PEC 37 só limitasse o poder de investigação em CPIs, isto poderia favorecer políticos como, por exemplo, o autor da proposta.

Felizmente, com o apelo da população, surgiram algumas sugestões de aperfeiçoamento da PEC 37, até que esta foi derrubada pela câmara. E, de quebra, ainda aprovaram outro projeto que destina 25% dos royalties do petróleo à saúde. Antes ia tudo para a educação. E outros projetos serão votados. Ao que parece, tudo graças às vozes das ruas.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Minha experiência nas manifestações do Rio

Decidi, na noite desta quinta-feira (20), ir para a rua participar da manifestação no Rio junto com amigos. Fui de verde como combinado, mas não sei se fiz certo, pois não sou veramente nacionalista. Fomos primeiro para a Avenida Presidente Vargas. Não achei muito violento. Ficamos bastante tempo lá e enfrentamos algumas bombas de gás lacrimogênio. Recomendaram-me cheirar um pano com vinagre para amenizar o efeito do gás, mas não achei que surtiu muito efeito. Depois de muito tempo de um lado para o outro gritando exigências e pejoratividades contra o governador e o prefeito, decidimos tomar o rumo de volta para casa. Mas acabamos parando na Lapa para relaxar.

Ficamos um tempo no início da Rua Joaquim Silva, perto dos arcos. Até que bombas de gás começaram a cair ali sem motivo aparente (o confronto era do outro lado dos arcos). Saímos em direção à estação de metrô. Mas, no meio do caminho, decidi que deveria retornar e fazer resistência. Os outros continuaram seguindo ao metrô. Quando voltei, o clima já havia amenizado. Mas era por puco tempo. Aos poucos vinham os vândalos àquela rua, contra a vontade das pessoas que estavam lá, que reclamavam que aqueles estavam atraindo a polícia. Tentei evitar que eles entrassem. Cheguei a parar um que estava visivelmente sob efeito de droga e munido de um pau do tamanho dele. Alguém veio me ajudar e, na base do diálogo, convencemo-lo a largar aquele pedaço de pau.

Mas então veio alguém jogando munição (talvez fogos ou bombas) contra a polícia e fugindo desta. Era uma briga de cão e gato: ele atacava a polícia e recuava, e a polícia avançava em direção a ele jogando bombas de gás; ele então atacava novamente a polícia e recuava mais, e a polícia avançava mais ainda com mais bombas de gás. Parecia que o tempo havia mudado: a entrada da rua estava enevoada de gás lacrimogênio. Não sabia para onde fugir do gás. Os sintomas agora eram mais fortes: além dos olhos que eu tentava proteger e limpar com a camisa, eu também tossia e salivava, cuspia, andando com a cabeça baixa. Adentrei a rua até onde não havia gás. Vi o batalhão de choque chegar com escudos e máscaras de gás. Fiquei gritando para eles, da calçada: "Para quê isso?! Para quê?! Precisa disso?!" O gás havia nitidamente alterado meu humor. Estava mais animoso de fato (a ponto de exigir resposta dos policiais de máscaras). E assim continuaria até voltar para casa e me deitar. As outras pessoas também diziam "Para quê isso?! Aqui só tem morador!" Muita gente já havia se refugiado nas casas e bares. Eu continuei na rua.

Mais tarde chegaram mais vândalos fugindo da polícia, com a cabeça coberta, apenas os olhos à mostra. Imagino que alguns deles, apenas alguns, tivessem ligação com o tráfico. Em meio a eles vi um menino de rua de uns sete anos com o rosto coberto com lenço. Em frente à Escadaria Selarón. Os outros, quando o viram, riram e um deles disse "É o menor guerrilheiro!" Quando ouviram a polícia chegando, cada um foi para um lado: alguns subiram a escadaria (na qual estavam muitas outras pessoas), outros seguiram a Joaquim Silva e outros desceram a Manoel Carneiro. Dois PMs chegaram de moto. Desceram das motos e deram um tiro em direção à escadaria. Na melhor das hipóteses, era bala de borracha. As pessoas subiram correndo assustadas. Eu gritava "Que é isso?! A PM disparando contra a escadaria! Não tem ninguém aqui para filmar isso?!" Nessa hora passei a me arrepender de não ter levado câmera. Mas foi um só tiro. Depois os PMs me viram gritando, um falou ao outro e passaram a jogar bombas de gás. E foram embora. Um homem veio até mim reclamar de alguém que não quis abrigá-lo. Fiquei algum tempo na rua conversando sobre a ocasião e as possíveis soluções para aquele tipo de problema com algumas pessoas que começavam a se sentir mais seguras de saírem às ruas. Meu ânimo estava tão afetado pelos acontecimentos a ponto de eu dizer que a PM tinha dado um tiro de fuzil contra a escadaria (xD). A verdade é que eu não reparei na arma e não havia passado pela minha cabeça que o tiro poderia ser de bala de borracha. Depois subi a escadaria e vi as pessoas fumando (óbvio!), que me olharam com um sorriso extasiado característico.

Vendo que tudo parecia mais calmo, e já cansado de tudo aquilo, fui até o ponto de ônibus. Minha primeira intenção era pegar o 247, mas, depois de muito tempo esperando, fui para outro ponto. A empresa devia ter cancelado as viagens do 247 naquele horário por segurança. Enquanto esperava ônibus, partilhava experiências com outras pessoas e debatia sobre problemas e soluções relacionados. Vi passar uns tantos ônibus da PM e algumas viaturas do CORE. Pensei comigo se aquilo era realmente necessário. Parecia que havia alguns traficantes por ali, mas não me lembro de ter visto ninguém com revólver ou fuzil (exceto a polícia). Em momento nenhum me vi em risco real de vida. Um homem no ponto me contou que as câmeras de segurança haviam sido quebradas por vândalos. (Talvez ele quisesse dizer que esta era a razão da presença do CORE.)

Já no ônibus, via-se os policiais jogando bombas de gás contra ninguém. O gás entrava pela janela do ônibus e incomodava os passageiros (eu já sabia me proteger). Nisto alguns passageiros jovens provocaram merecidamente um policial que passava de moto ao lado do ônibus e que havia jogado uma bomba de gás. (Estranhamente o policial se sentiu fragilizado com a provocação.) Cheguei em casa xingando a PM. Não consegui dormir direito.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Violência × Vandalismo do privado × Vandalismo do público

Lendo as opiniões a respeito da violência e do vandalismo na internet, parece-me que muitas pessoas não sabem a diferença entre os dois. Sou contra a violência física, não quero nenhum tipo de guerra. Mas coisa bem diferente é o vandalismo. E, mesmo quando se trata de vandalismo, há o vandalismo do patrimônio público e o do privado. Também discordo do vandalismo do patrimônio privado. (Exceto em algumas ações necessárias de perseguição política.) Um cidadão inocente não merece ter seu carro queimado para satisfação de alguns manifestantes. As concessionárias também nada têm a ver com isso. Sei que alguns destes manifestantes entendem que estas ações são mormente simbólicas e poderiam promover a participação de outras pessoas (no caso, os donos dos carros queimados e das concessionárias) nas manifestações. Mas, assim como é direito de cada um protestar contra o quadro político atual, também o é o de não participar das manifestações. E atitudes como esta não incentivam a participação de ninguém, muito pelo contrário. Só o que ainda fez sentido foi a depredação dos ônibus caso se tenha entendido que o aumento da tarifa surgiu para gozo das empresas de transporte coletivo.

Sem contar os atos, diria, verdadeiramente criminosos como o saque a lojas. Obviamente a manifestação foi, por esta corja de protestantes, usada como pretexto para o roubo. Verdadeiros ladrões que aproveitaram a aglomeração pública para cometer seus crimes. Não sou deveras moralista; se um ladrão deste tipo rouba ou furta, o problema é da polícia, eu pouco me importo. Mas vivemos numa sociedade fortemente moralista, e devemos tê-lo em mente. Se roubos são cometidos durante os protestos, isto pode desmoralizá-lo e fazer com que autoridades se foquem por um momento neste problema para não cumprir nossas exigências. Mas, devo concordar, isto teria pouquíssimo efeito e provavelmente não viria a acontecer.

Por fim, há o vandalismo do patrimônio público. Este, sim, faz todo sentido. Mas não precisa ser usado sempre. Geralmente, é suficiente fazer pressão psicológica contra as autoridades. Mas, às vezes, isto não funciona. Políticos podem nos ignorar. E por muito tempo. Neste caso, devemos no fazer ouvir, gritar pelas mãos de modo que nossos gritos manchem paredes e sujem o chão e quebrem a mobília. Muitos perguntariam: "Mas e o valor histórico-cultural desses patrimônios?" Ora, o que é o valor histórico-cultural de um patrimônio público comparado aos nossos direitos? Estes valem muito mais. Além disso, são as autoridades que se responsabilizarão pela restauração destes patrimônios, o que quer dizer que teremos uma hora de certeza de que o dinheiro arrecadado com impostos serão bem gastos. Absurdo é ver "voluntários" na limpeza destas depredações. Estas pessoas estão se subjugando gratuitamente fazendo um papel que é do Estado. E estão desmoralizando uma forma de protesto que, por várias vezes, já se mostrou eficaz na história mundial. Mas, claro, não na brasileira.

Quero a dissolução da PMERJ

Aproveitando os protestos recentes no Brasil e, particularmente, no Rio de Janeiro, faço apologia aqui à dissolução da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Como bem sabemos, a PM foi instituída para fazer guerra. Guerra ao tráfico e, principalmente, ao poder paralelo. De fato, as intenções do governo ao usar a força da PM não é acabar com o tráfico, sendo isto apenas um pretexto moralista, mas garantir o poder do governo, a falsa ordem. Afinal, quando um não quer, dois não brigam.

A PM não tem aumentado a segurança, muito pelo contrário. Antes da "pacificação", a violência só havia aumentado. Além das vítimas do tráfico, surgiram vítimas do confronto entre traficantes e a PM. E, neste caso, não adianta querer culpar um ou outro. A culpa está dividida. E não adianta dizer que o tráfico acabou pois não é verdade. As bocas de fumo ainda existem e sequer se tornaram menos rastreáveis, apenas ignoradas.

Outro problema com relação à PM é que ela trata todos igualmente, mas num sentido negativo. Ela não distingue bandidos e cidadãos inocentes. Foi assim nos processos de pacificação, em que o risco à população sequer foi enfatizado pela imprensa, já que esta era a favor. É assim nos carnavais no morro, em que a PM atira contra a massa à procura de bandido, sem respeitar o direito da população ao entretenimento. É assim em áreas residenciais onde a PM faz operações que põe em risco a vida dos moradores (desta vez com críticas da imprensa). E foi assim na noite de segunda-feira em meio à manifestação. Policiais militares deram tiros de fuzil para o alto. E alguns tiros acertaram a população. Inclusive pessoas inocentes. Segundo a própria PM, ela foi acionada após atearem fogo em frente à porta da alerj, o que teria caracterizado um risco iminente. Detalhe: pelos vídeos filmados pela imprensa, não havia ninguém por perto que pudesse correr risco, e as luzes do prédio da alerj estavam apagadas.

Muito esforço se tem feito, desde anos atrás, para preparar e humanizar a PM. Mas, até que se obtenha resultados satisfatórios, muita gente inocente está sendo morta. É mais eficiente dissolver a PM e preparar a polícia civil. Os ex-PMs poderiam ser então integrados à polícia civil. Com risco de contaminação desta infelizmente. A polícia civil receberia assim um preparo adequado e aprenderia a discernir situações, utilizar a força conforme a situação (não o governo) exige. Além do mais, devemos tomar cuidado para que a PM não se torne uma ferramenta governamental de repressão de manifestações. Pois foi o que aconteceu nesta segunda-feira. E, enquanto este quadro não muda, "força" é um eufemismo para "violência".