terça-feira, 19 de abril de 2016

Fora, Temer e Cunha!

(Desculpe-me o leitor por não ter escrito um artigo tão grande e com tantos argumentos quanto o Fora, Dilma!, mas a razão é que não há tão bons argumentos contra o impeachment de Temer e Cunha quanto contra o impeachment de Dilma.)

Este artigo pode ser entendido como uma continuação ao artigo interno Fora, Dilma!, no qual eu defendi o processo de impedimento da presidente da república como meio de reforma ética/moral. Faltou deixar claro, naquele mesmo artigo, que o principal erro da presidente foi adotar, de forma errada, políticas para o suposto crescimento econômico, refletidas no famoso slogan de governo “País rico é país sem pobreza”, mas que só afundaram mais o país em crise. Pouco entendo de Ciências Econômicas, mas dado que a presidente é formada nesta área, acredito ser pouco provável que ela não entendesse as consequências de sua política. Mais ainda, lembremos das evidências de maquiagem nas estatísticas do IBGE. [1] [2] [3] [4] Dadas estas contradições, concluímos que as intenções da presidente por trás dessas políticas ineficientes eram demagogia e propaganda eleitoral.

Por outro lado, algumas pessoas reclamaram comigo por eu não ter criticado igualmente o vice-presidente da república Michel Temer e o presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha. Elas estavam certas. Temer assinou quatro das “pedaladas fiscais” enquanto Dilma viajava. E Cunha possui conta não declarada no exterior recheada de dinheiro supostamente desviado. Ambos estão, portanto, envolvidos em escândalos de corrupção e merecem o impedimento. Aliás, já foram requeridos processos de impedimento contra Cunha e Temer na Câmara. O problema é que esses pedidos devem ser primeiramente analisados pelo próprio presidente da Câmara, Eduardo Cunha (o velho dilema de uma autoridade julgar a si mesma). Além disso, se apenas a Dilma sofrer impedimento, o cargo de presidente é ocupado por seu sucessor direto, i.e., o vice Temer. Em outras palavras, impedir apenas a Dilma é trocar seis por meia dúzia. E pode significar, de fato, como dizem os petistas, um golpe peemedebista.

A solução é exigir o impedimento de ambos, presidente e vice. Segundo a Constituição, no caso de dupla vacância destes cargos (i.e., quando ambos os cargos são liberados), deve-se fazer novas eleições para presidente. É particularmente conveniente para a população brasileira que a dupla vacância ocorra ainda este ano, caso em que as eleições são diretas. Se a dupla vacância ocorrer em 2017 ou 2018, as eleições pra presidente são indiretas, ou seja, quem vota é o Senado. Portanto, devemos ser ágeis se quisermos ter o direito de eleger o presidente.

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Impostos e o antagonismo da instrução

A palavra imposto pouco nos diz na sua origem. É o particípio do verbo impor, o que evidencia o imposto como obrigação. Há um sinônimo, porém, mais significativo: tributo. Usada também em outras situações (p. ex., no meio artístico), esta palavra tem o sentido básico de “homenagem”, “mérito”. Mais usada na Antiguidade e na Idade Média, referia-se a uma “homenagem obrigatória” prestada ao soberano por governar a nação; um soberano tido como o único capaz de governar bem e visto para tanto como um deus ou o escolhido de um deus. O tributo surgiu antes mesmo do dinheiro, quando era pago por meio de sacrifícios e ofertas de alimentos. Depois da invenção da moeda, os sacrifícios e oferendas foram aos poucos sendo substituídos pelo dinheiro. Em algumas nações, também era pago um tributo aos sacerdotes; por exemplo, na antiga Israel, o povo pagava um dízimo ao Templo, “tradição” que se manteve no cristianismo. É importante observar que, até então, inexistiam os serviços públicos; serviços de saúde e educação eram muito precariamente prestados por sacerdotes e filósofos.

No final do séc. XVIII, o rei Luís XVI da França gastava todo o dinheiro dos impostos com a opulência da nobreza: roupas luxuosas, peças de ouro no palácio, pratos requintados… A nobreza e o clero não pagavam impostos, mas eram os únicos a usufruir deles. Enquanto isso, grande parte da população francesa passava fome e se revoltava (Revolução Francesa). O que fazer? Alguns intelectuais, os iluministas, apresentavam suas ideias. A primeira era acabar com os impostos, o que era praticamente impossível, pois fugia aos interesses do soberano. A segunda ideia, vitoriosa, foi a criação de serviços públicos pra suprir as necessidades da população e, principalmente, argumentar a exigência dos impostos. Esta foi a medida adotada por Napoleão Bonaparte após a revolução, no início do séc. XIX, justamente para evitar uma nova revolução. Foi a partir daí que surgiu a ideia de que o Estado precisa prestar serviços à população e que, para tanto, a população deve pagar seus impostos ao Estado. Na prática, porém, permanece na mentalidade dos políticos a ideia dos impostos como mérito deles, o que se evidencia pelos frequentes desvios de verbas.

Pouco tempo mais tarde, um dos serviços públicos criado pelo Estado (especificamente Prússia) foi a educação. Esta objetivava principalmente a formação da cidadania (i.e., a obediência ao Estado) e de profissionais qualificados pra trabalharem nas indústrias. A população foi se tornando cada vez mais instruída. Como efeito colateral indesejado, os cidadãos têm se tornado cada vez mais conscientes politicamente. Assim têm se tornado mais aptos a lutar por seus direitos e pelos interesses coletivos. Isso se mostrou um problema pro Estado, que ele agora tenta solucionar através da opressão antecipada: oprimir rapidamente a população, antes que ela possa reagir ou se manifestar, fortalecendo assim a imagem do Estado, que acaba parecendo imbatível.


Recomendo a leitura do artigo A criação do ensino obrigatório. Só peca pela tradução de Realschule, que quer dizer escola real ou escola da realeza, não verdadeira escola. Não pude confirmar se o sistema Volkshoch‑/​Realschule continua existindo na Alemanha, como também não sei se o ensino doméstico é permitido aqui no Brasil.

As crianças não são animais de estimação para serem domesticadas; não são barro para moldar, não são computadores para programar e, acima de tudo, não são vasos para se encher.
Alfie Khon